Sostenes Lima:
Quando a gente escreve alguma coisa, algo de nós se desnuda;
Algo de nós se desgruda e toma forma autônoma. O texto, uma vez escrito, segue o seu próprio
caminho.
Osvaldo Luiz Ribeiro:
A questão que me interessa, e só ela, é:
- o que você falou e pôs lá, sua fala e discurso, continua
lá, a despeito da deriva dessa jangada no mar polissêmico?
- se sim, ela ainda pode ser recuperada?
Sostenes Lima:
Questões interessantes. Vamos ao que penso sobre elas:
1. O sujeito enunciador jamais pode ser apagado do texto.
Ele e seu entorno discursivo (identidade, relações, ideologia, crenças etc.)
estão irredutivelmente inscritos no texto. Mas há um problema. O texto - se
considerarmos apenas a sua materialidade - permanece inalterado no tempo,
apesar das mudanças inevitáveis do sujeito enunciador e dos sujeitos
coenunciadores. Isso quer dizer que o autor de um texto, passado algum tempo,
não existe mais na história. Outro sujeito se erige sobre suas memórias e sobre
seus escombros históricos. Quando produzimos um texto, devemos estar cientes de
que, mais cedo ou mais tarde, não seremos mais o autor daquele texto, uma vez
que discursivamente já teremos nos tornado outro enunciador, atravessado por
outras redes e formações discursivas.
2. Disso conclui-se que o discurso autoral realizado num
texto só pode ser recuperado à luz de uma retrospectiva histórica. O que eu
disse em um texto há algum tempo só pode ser atribuído a mim atualmente de um
ponto de vista material e jurídico. De um ponto de vista discursivo, o texto já
é outro (uma vez que as condições de leitura são outras) e o autor também é
outro (uma vez que estou ligado a uma nova configuração sociodiscursiva e
histórica).
Osvaldo Luiz Ribeiro:
De tudo o que você disse, tudo muito óbvio, o que faz de
você um positivista, como dizem que eu sou, e um fundamentalista, por quem
também me tratam, é que você manteve a possibilidade, pelo viés histórico, da
tentativa de recuperação do discurso autoral: "Disso conclui-se que o
discurso autoral realizado num texto só pode ser recuperado à luz de uma
retrospectiva histórica".
Positivista fundamentalista igual a mim...
Seja como for, só isso me interessa: a arqueologia do
sentido autoral.
Sostenes Lima:
Embora eu seja (rs), não sei bem o que é ser um positivista.
Considerando o texto acima como material de análise, em que consiste exatamente
o meu (e o seu) positivismo?
Osvaldo Luiz Ribeiro:
Exatamente nisso - em acreditar que é possível tentar
recuperar o discurso autoral - positivismo e fundamentalismo, porque você
pressupõe "objetividade" da busca/pesquisa e "fundamentos
discursivos fixos em códigos"... Acredite. Não foi nem uma nem duas
pessoas que já me disseram isso, entre risos que Freud ensinou a dar...
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