Era uma vez um velhinho simpático que morava numa casa
cercada de jardins. O velhinho amava o seu jardim e cuidava dele pessoalmente.
Na verdade fora ele que pessoalmente o plantara – flores de todos os tipos,
árvores frutíferas das mais variadas espécies, fontes, cachoeiras, lagos cheios
de peixes, patos, gansos, garças. Os pássaros amavam o jardim, faziam seus
ninhos em suas árvores e comiam dos seus frutos. As borboletas e abelhas iam de
flor em flor, enchendo o espaço com as suas danças. Tão bom era o velhinho que
o seu jardim era aberto a todos: crianças, velhos, namorados, adultos cansados.
Todos podiam comer de suas frutas e nadar nos seus lagos de águas cristalinas.
O jardim do velhinho era um verdadeiro paraíso, um lugar de felicidade.
O velhinho amava todas as criaturas e havia sempre um
sorriso manso no seu rosto. Prestando-se um pouco de atenção, era possível ver
que havia profundas cicatrizes nas mãos e nas pernas do velhinho. Contava-se
que, certa vez, o velhinho, para salvar uma criança, lutou com o cão e foi
nessa luta que ele ganhou suas cicatrizes.
Os fundos do terreno da casa do velhinho davam para um
bosque misterioso que se transformava numa mata. Era diferente do jardim,
porque a mata, não tocada pelas mãos do velhinho, crescera selvagem como
crescem todas as matas. O velhinho achava as matas selvagens tão belas quanto os
jardins. Quando o sol se punha e a noite descia, o velhinho tinha um hábito que
a todos intrigava: ele se embrenhava pela mata e desaparecia, só voltando para
o seu jardim quando o sol nascia.
Ninguém sabia direito o que ele fazia na mata e estranhos rumores
começaram a circular. Os seres humanos têm sempre uma tendência para imaginar
coisas sinistras. Começaram, então, a espalhar o boato de que o velhinho ,
quando a noite caía, se transformava num ser monstruoso, parecido com
lobisomem, e que na floresta existia uma caverna profunda onde o velhinho
mantinha, acorrentadas, pessoas de quem ele não gostava, e que o seu prazer era
torturá-las com lâminas afiadas e ferros em brasa. Lá – assim corria o boato –,
o velhinho babava de prazer vendo o sofrimento dos seus prisioneiros.
Outros diziam, ao contrário, que não era nada disto. Não
havia nem caverna, nem prisioneiros e nem torturas. Essas coisas existiam mesmo
era só na imaginação de pessoas malvadas que inventavam boatos. O que acontecia
era que o velhinho era um místico que amava as florestas e entrava no seu
escuro para ficar em silêncio, em comunhão com o mistério do universo. Quem era
o velhinho na realidade? Você decide. Sua decisão será um reflexo do seu
coração.
*Alves, Rubem. Do universo
à jabuticaba. São Paulo: Planeta, 2010 [Ebook].
Ótimo texto para refletir!
ResponderExcluirEsse texto expressa bem a misericórdia e a graça de Deus em nossas vidas. E, o qto,julgamos mal todo o resto...
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